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Ypres

por Sofia Loureiro dos Santos, em 21.06.18

Toda a Flandres (na França e na Bélgica) foi transformada num enorme cemitério, na altura da Primeira Grande Guerra. Particularmente em Ypres, as ruínas em que ficou demonstra bem a violência dos ataques que sofreu. Todos os exércitos aliados tiveram pesadas baixas e os canadianos foram expostos aos primeiros ataques com gás mostarda por parte dos alemães.

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Ypres - Catedral em ruínas

 

Na porta (Gate) de Menin Road (Menenpoort em flamengo), tal como ficou conhecida pelas tropas britânicas e dos países da Commonwealth que ali lutaram e morreram durante os anos da guerra, foi erigido um Memorial aos milhares de soldados que nunca foram identificados ou encontrados, sem sepultura conhecida. Os seus nomes estão gravados por todo o interior do memorial.

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Este memorial foi inaugurado em 1927 e, um ano depois, um grupo de ilustres cidadãos de Ypres encontrou uma forma de mostrar a sua gratidão a todos os que tinham morrido pela libertação da Bélgica. Diariamente, às 20:00h, é tocado o toque militar aos mortos – The Last Post, na porta do Memorial, no lado oriental de Ypres. A primeira cerimónia foi a 1 de Julho de 1928 e, desde esse dia, com um intervalo de alguns meses até 11 de Novembro de 1929, todos os dias à mesma hora é tocado o last post, com excepção dos 4 anos da ocupação germânica de Ypres, durante a II Guerra Mundial (20 de Maio de 1941 a 6 de Setembro de 1944).

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Todos os dias se junta uma multidão, aguardando a cerimónia. Repentinamente faz-se um silêncio total e todos os que conversavam animadamente se calam ao som das cornetas. É muitíssimo dramático e comovente e eu, que muito facilmente me comovo, chorei mesmo durante aqueles minutos. Há sempre alguém que declama uma das estrofes de um poema de Robert Laurence Binyon – The Fallen:

 

They shall grow not old, as we that are left grow old:

Age shall not weary them, nor the years condemn.

At the going down of the sun and in the morning

We will remember them.

 

Este foi um dia muito preenchido por emoções, como todos os que dedicamos a conhecer e a visitar tudo o que tem a ver com as duas grandes guerras. Já durante a manhã tínhamos visitado o Cemitério Militar Português de Richebourg, onde estão sepultados 1831 corpos de soldados portugueses, 238 sem identificação, mortos durante a campanha do Corpo Expedicionário Português, predominantemente na batalha de La Lys.

cemiterio portugues.jpg

Tanta juventude ceifada por todo o lado, nesta Europa que deveria ter aprendido com a sangria de 1914 – 1918, que voltou a sangrar entre 1939 e 1945, e que está, a pouco e pouco, a ressuscitar tantos fantasmas que julgávamos enterrados de vez, como a xenofobia e o racismo.

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Lille

 

Visitámos ainda, ao pé de Lille, na vila de Ascq o local aonde se deu o massacre de Ascq – uma resposta mortífera e totalmente desproporcionada de tropas alemães a um atentado feito pela Resistência (1 de Abril de 1944) a um comboio que transportava equipamento militar alemão. Do atentado não resultaram feridos e os danos materiais forma mínimos, mas as tropas SS chacinaram 80 civis. O local passa totalmente desapercebido e, pelo estado em que se encontra, dá a sensação de que os próprios franceses não lhe dão qualquer importância.

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O dia acabou num excelente restaurante em Ypres, onde também se vendiam louças e outros utensílios e decorações de cozinha, chamado DÉPOT. Uma tábua de queijos, patés e enchidos, bem regados com cerveja, da menos alcoólica, diga-se, pois as da casa, premiadas, tinham cerca de 8 graus, deu-nos o alento que necessitávamos depois de tão grandes emoções.

 

The Fallen

 

With proud thanksgiving, a mother for her children,

England mourns for her dead across the sea.

Flesh of her flesh they were, spirit of her spirit,

Fallen in the cause of the free.

 

Solemn the drums thrill: Death august and royal

Sings sorrow up into immortal spheres.

There is music in the midst of desolation

And a glory that shines upon our tears.

 

They went with songs to the battle, they were young,

Straight of limb, true of eye, steady and aglow.

They were staunch to the end against odds uncounted,

They fell with their faces to the foe.

 

They shall grow not old, as we that are left grow old:

Age shall not weary them, nor the years condemn.

At the going down of the sun and in the morning

We will remember them.

 

They mingle not with their laughing comrades again;

They sit no more at familiar tables of home;

They have no lot in our labour of the day-time;

They sleep beyond England's foam.

 

But where our desires are and our hopes profound,

Felt as a well-spring that is hidden from sight,

To the innermost heart of their own land they are known

As the stars are known to the Night;

 

As the stars that shall be bright when we are dust,

Moving in marches upon the heavenly plain,

As the stars that are starry in the time of our darkness,

To the end, to the end, they remain.

 

Robert Laurence Binyon

The Times - 21/ Setembro/ 1914.

 

 

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publicado às 17:48



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