Salvador Dali -1960
Viro o Natal do avesso
examino-lhe as costuras
corto estrelas em excesso
aconchego nas suturas.
Fui ao mato buscar lenha
para acender a lareira
sem amor que me sustenha
arde a alma na fogueira.
Abri a porta da casa
ao Menino que nasceu
há um mundo que extravasa
a tristeza que há no meu.
Parti o pão que me deste
bebi da água e do vinho
meu Menino que nasceste
rodeado de azevinho.
Viro o Natal do direito
e penteio-lhe a nervura
verde lindo e sem defeito
polvilhado de ternura.
Oh meu menino de oiro
minha alminha tão nobre
quem te deu como tesoiro
uma vida que é de pobre.
Oh meu perfeito menino
que és tão puro e natural
quem te deu como destino
lavar o mundo do mal.
Oh meu menino Jesus
que nasces todos os anos
que carregas uma cruz
de tristezas e enganos
Oh meu menino querido
não te afastes de nós
neste tempo desabrido
em que nos sentimos sós.
Oh meu menino tisnado
que secas o nosso pranto
a dormir tão descansado
no embalo deste canto.
Oh meu menino de trigo
seara da minha vida
que possas sentir abrigo
nesta voz enternecida.
Oh meu menino moreno
que sofres com meu penar
que possas ser o sereno
da noite que me levar.
Procuro a balada lenta
nesta noite abençoada,
no centro de uma tormenta
a bonança aconchegada.
Centramos as nossas vidas
na mesa da consoada,
lá fora há mãos estendidas
e sonhos sem alvorada.
Não sei se é o destino
que abre as portas à luz,
nem sei se um pobre menino
se chama sempre Jesus.
Mas sei que brilha uma chama
que desafia a razão:
é o calor de quem ama
e arde na solidão.
Stefano di Giovanni
Quero dar ao meu amor
um fio do meu cabelo
ternura branca de dor
rugas fundas em novelo.
Minha alma estendida
umas mãos cheias de nada
o resto da minha vida
a seu lado ancorada.
A doçura da romã
quero dar ao meu amado
o respirar da manhã
rumor do campo acordado.
Quando chegar o Natal
com a penúria enfeitada
em poeira de cristal
serei a noite encantada.
E enquanto o tempo quiser
serão meus braços seu manto
sempre que o céu mantiver
o tom cinzento de pranto.
E enquanto o tempo poisar
no ombro do nosso amor
nos dias que irão faltar
o mundo será melhor.
Pelo vento deste norte
entra a chuva de permeio
pelo teto da má sorte
já perdemos o sorteio.
Nem taluda de Natal
aquece o fim de Janeiro
nem festa de Carnaval
alumia o ano inteiro.
Vaticinam Entidades
em voz alta ou burburinho
tormentosas tempestades
a barrar-nos o caminho.
Respiramos nevoeiros
lendas velhas com bolor
sem armas nem cavaleiros
que nos respeitem a dor.
Faremos do astro rei
terra água fogo e ar
pelo povo e pela grei
havemos nós de clamar.
De Jesus não precisamos
parcos de fé e tão poucos
ao Menino nós amamos
mesmo que cegos e loucos.
Somos nós filhos de Deus
a pedir felicidade
possa ele fazer seus
nossos sonhos sem idade.
Cindy Thomas: Family
Meu rico menino pobre, alminha do meu sustento, o manto que não te cobre protege a casa do vento.
Meu rico filho sem sorte cordeiro limpo de medo, o pai destina-te a morte a mãe esconde um segredo.
Foge meu rico santinho não queiras marca de Abel, dócil como cordeirinho o amargo sabor do mel.
Foge depressa, oh irmão do malquerer do destino, esquece o futuro que não te deixa viver, oh menino.