Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]


Ao desconcerto do mundo

por Sofia Loureiro dos Santos, em 18.02.24

luis de camoes.jpg

Luís de Camóes

António Soares

 

Os bons vi sempre passar

No mundo graves tormentos;

E para mais m´espantar,

Os maus vi sempre nadar

Em mar de contentamentos.

Cuidando alcançar assim

O bem tão mal ordenado.

Fui mau, mas fui castigado:

Assim que: só para mim

Anda o mundo concertado

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 20:44

Cada um cumpre o destino que lhe cumpre

por Sofia Loureiro dos Santos, em 04.02.24

fate lines.jpg

Valeriy Osmakov

 

Cada um cumpre o destino que lhe cumpre.

E deseja o destino que deseja;

                Nem cumpre o que deseja,

                Nem deseja o que cumpre.

 

Como as pedras na orla dos canteiros

O Fado nos dispõe, e ali ficamos;

                Que a Sorte nos fez postos

                Onde houvemos de sê-lo.

 

Não tenhamos melhor conhecimento

Do que nos coube que de que nos coube.

                Cumpramos o que somos.

                Nada mais nos é dado.


[Ricardo Reis]

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 20:44

Enquanto

por Sofia Loureiro dos Santos, em 30.09.23

enquanto.jpg

Enquanto

 

Enquanto houver um homem caído de bruços no passeio

e um sargento que lhe volta o corpo com a ponta do pé

para ver como é;

enquanto o sangue gorgolejar das artérias abertas

e correr pelos interstícios das pedras,

pressuroso e vivo como vermelhas minhocas despertas;

enquanto as crianças de olhos lívidos e redondos como luas,

órfãs de pais e de mães,

andarem acossadas pelas ruas

como matilhas de cães;

enquanto as aves tiverem de interromper o seu canto

com o coraçãozinho débil a saltar-lhes do peito fremente,

num silêncio de espanto

rasgado pelo grito da sereia estridente;

enquanto o grande pássaro de fogo e alumínio

cobrir o mundo com a sombra escaldante das suas asas

amassando na mesma lama de extermínio

os ossos dos homens e as traves das suas casas;

enquanto tudo isto acontecer, e o mais que se não diz por ser verdade,

enquanto for preciso lutar até ao desespero da agonia,

o poeta escreverá com alcatrão nos muros da cidade:

ABAIXO O MISTÉRIO DA POESIA

António Gedeão

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 15:32

Da simplicidade

por Sofia Loureiro dos Santos, em 07.08.23

emily amalia.jpg

Parece tão simples e lógico. Ditas pelo Papa as palavras têm uma ressonância ligada à fé, aos preceitos dos que pertencem a uma comunidade religiosa.

Mas o que o Papa disse, de uma forma assertiva e, para a Igreja, revolucionária, é exactamente o fundamento do cristianismo e de todos os que olham para a vida e lhe vêm a essência, o que, de facto, importa.

Uma sociedade inclusiva, que olha e toma conta dos que mais necessitam, que não distingue a etnia, a cor, a religião, o estatuto, o poder, seja ele de que tipo for, uma sociedade que dá mais importância ao outro que a si próprio, que divide, que partilha, que é tolerante, que é livre.

Amar e ser amado, fazer alguma coisa por alguém.

Parece tão simples e lógico.

 

IF I CAN STOP ONE HEART FROM BREAKING

 

If I can stop one heart from breaking,

I shall not live in vain;

If I can ease one life the aching,

Or cool one pain,

Or help one fainting robin

Unto his nest again,

I shall not live in vain.

[Emily Dickinson]

 

AL CABO

 

Al cabo, son muy pocas las palabras

que de verdade nos duelen, y muy pocas

las que consiguen alegrar el alma.

Y son también muy pocas las personas

que mueven nuestro corazón, y menos

aún las que lo mueven mucho tiempo.

Al cabo, son poquísimas las cosas

que de verdad importan en la vida:

poder querer a alguien, que nos quieran

y no morir después que nuestros hijos.

[Amalia Bautista]

 

E é sempre tão difícil.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 15:51

Assim o amor

por Sofia Loureiro dos Santos, em 06.11.22

sofia_melo_breyner.jpg

Sophia de Mello Breyner Andresen

 

Assim o amor

Espantando meu olhar com teus cabelos

Espantando meu olhar com teus cavalos

E grandes praias fluidas avenidas

Tardes que oscilavam demoradas

E um confuso rumor de obscuras vidas

E o tempo sentado no limiar dos campos

Com seu fuso sua faca e seus novelos

 

Em vão busquei eterna luz precisa

 

Sophia de Mello Breyner Andresen

in Geografia, 1967

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 21:07

Verbo Feminino

por Sofia Loureiro dos Santos, em 24.09.22

Verbo feminino.jpg

É difícil falar do recital de Natália Luísa e Rui Rebelo, no Teatro Meridional.

É difícil encontrar palavras para esta celebração da palavra das poetas dos vários espaços da Lusofonia.

É difícil explicar o sentimento de pertença, a sensação do maravilhoso, o escutar da voz da Natália tão bem acompanhada pela discreta e simples música de Rui Rebelo, da luz, do cenário, da elegância, da sensibilidade, da qualidade e variedade dos poemas ditos, interpretados, vividos.

Mas é muito fácil saber o porquê desta magia, do encantamento em que nos envolve a Natália. Do trabalho de pesquisa, da beleza de tudo o que faz.

E é fácil encontrar o espírito de luta, irmandade e solidariedade, mesmo na solidão e na revolta.

Que grande espectáculo, simbolicamente dedicado às mulheres iranianas.

Parabéns ao Meridional, ao Rui Rebelo e, sobretudo, à Natália.

Que privilégio poder assistir a este Recital!

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 22:32

O Som que os Versos fazem ao Abrir

por Sofia Loureiro dos Santos, em 06.08.22

ana luisa amaral.jpg

Poemas de amor

Ana Luísa Amaral e Luís Caetano

29 de Junho de 2022

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 15:54

Sífiso

por Sofia Loureiro dos Santos, em 04.07.22

Sífiso.jpg

Sisyphus

Ticiano

 

Recomeça....

Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças...

 

[Miguel Torga]

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 21:19

Uma Pequenina Luz

por Sofia Loureiro dos Santos, em 12.09.21

jorge sampaio

Cerimónias fúnebres de Jorge Sampaio (09:46)

 

Uma pequenina luz bruxuleante

não na distância brilhando no extremo da estrada

aqui no meio de nós e a multidão em volta

une toute petite lumière

just a little light

una picolla… em todas as línguas do mundo

uma pequena luz bruxuleante

brilhando incerta mas brilhando

aqui no meio de nós

entre o bafo quente da multidão

a ventania dos cerros e a brisa dos mares

e o sopro azedo dos que a não vêem

só a adivinham e raivosamente assopram.

Uma pequena luz

que vacila exacta

que bruxuleia firme

que não ilumina apenas brilha.

Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.

Muda como a exactidão como a firmeza

como a justiça.

Brilhando indefectível.

Silenciosa não crepita

não consome não custa dinheiro.

Não é ela que custa dinheiro.

Não aquece também os que de frio se juntam.

Não ilumina também os rostos que se curvam.

Apenas brilha bruxuleia ondeia

indefectível próxima dourada.

Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.

Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.

Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.

Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.

Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:

brilha.

Uma pequenina luz bruxuleante e muda

como a exactidão como a firmeza

como a justiça.

Apenas como elas.

Mas brilha.

Não na distância. Aqui

no meio de nós.

Brilha

 

Jorge de Sena

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 16:37

Pedro Tamen

Revisitação de post

por Sofia Loureiro dos Santos, em 29.07.21

pedro tamen.jpg

Gostava de ter conhecido Pedro Tamen. Gostava de ter conhecido o seu silencioso estar, fora das televisões, dos blogues, dos facebooks, fora da incrível tentação de dizer coisas, muitas e importantes coisas, tão interessantes, literárias, mundanas e triviais, aquelas coisas que todos estamos sempre com tanta vontade de dizer.

Gostava de ter conhecido Pedro Tamen. Ou se calhar não. Gosto só da ideia, da imagem que tenho dele, por não ter nenhuma, a não ser da poesia que escreve e de que eu gosto tanto.

 

17.

No clandestino recanto

com que sentado labuto

os pespontos do meu canto,

 

neste perdido reduto

em que as mãos amadurecem

a peça que fugirá

das mãos dos que não merecem

para andar ao deus-dará

num universo de espanto

 

em que o amor vai curtido,

calado, surdo, tingido

de uma cor que é o sentido

da salvação que acalanto

 

- aqui me caio e levanto.

 

O Livro do Sapateiro

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 21:31


Mais sobre mim

foto do autor



Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.




Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2012
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2011
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2010
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2009
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2008
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2007
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2006
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D
  248. 2005
  249. J
  250. F
  251. M
  252. A
  253. M
  254. J
  255. J
  256. A
  257. S
  258. O
  259. N
  260. D

Maria Sofia Magalhães

prosas biblicas 1.jpg

À venda na livraria Ler Devagar



caminho dos ossos.jpg

 

ciclo da pedra.jpg

 À venda na Edita-me e na Wook

 

da sombra que somos.jpg

À venda na Derva Editores e na Wook

 

a luz que se esconde.jpg