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No Brasil a democracia treme. As regras do voto livre, da aceitação dos resultados eleitorais, da sã convivência entre as várias alas políticas, a tolerância e o respeito pelas Instituições são cada vez mais uma miragem.
Como nos EUA, os camaradas de Trump seguem-lhe o exemplo.
A extrema-direita pulula e tende a clonar-se. A polícia assiste, impávida, aso ululantes terroristas internos.
Como isto tudo é dolorosamente conhecido. Como tudo isto é assustadoramente premonitório.
O viver democrático está a deixar de fazer sentido para muita gente.
Tempos de chumbo.
No frenesim de apoiar os ucranianos, que defendem o seu país da invasão da Rússia, um estado ditatorial imposto por Putin, estão a atingir-se proporções assustadoras no que diz respeito à massificação do espectáculo que é a solidariedade e às boas intenções dos povos democráticos.
Mas, como em tudo, não há bons e maus, heróis e vilãos, por muito que seja isso o que a inundação mediática nos faz crer. O mundo livre, nomeadamente os países da União Europeia e os EUA, combate a Rússia, não os russos.
No mundo livre e democrático, ninguém deve ser obrigada a dizer quais as suas opções políticas. Ninguém deve ser perseguido pelas suas opiniões ou pelo silêncio sobre elas.
Considero uma aberração, compreensível, mas não deixando de o ser, as várias manifestações de bulling à comunidade russa portuguesa, tal como aos intelectuais que não se declaram contra a invasão e contra Putin. Num país em que o uso da palavra guerra é considerado traição, parece-me incrível que os corajosos intelectuais ocidentais, sentados confortavelmente nas suas sociedades livres e democráticas, julguem aqueles que pagam com a sua liberdade e a sua vida a manifestação de discordância perante o poder autocrático de um ditador.
Ainda por cima vindo de tantos que, por exemplo em Portugal e durante a ditadura, tiveram que assinar documentos em que negavam ser comunistas ou participar em actividades subversivas para que pudessem manter o emprego.
A liberdade deve ser para todos, de se manifestarem ou de não se manifestarem. Tenho as maiores dúvidas sobre os boicotes culturais e sobre a condenação de quem não expressa o que, subitamente, se tornou na nova verdade inquestionável e soberana. Tenho as maiores reticências à censura de canais de televisão e de agências de informação.
Tenho um enorme cepticismo sobre estas ondas mediáticas intensíssimas e fugazes, que se arriscam a soçobrar perante o peso do ruído omnipresente.
Tenho uma enorme desconfiança a tantos postos de trabalho já disponíveis a quem foge da guerra. Será que já se esqueceram dos médicos, engenheiros, professores, músicos e tantos outros técnicos qualificados que, durante anos, alimentaram a mão de obra barata da construção civil e do serviço doméstico, sem que o país lhes reconhecesse as competências e pudesse oferecer-lhes os empregos correspondentes às suas qualificações?
Há muita crueldade nestas ondas mediáticas de apoios, julgamentos e solidariedades, muitas vezes postiças e fúteis. Espero que esteja enganada, pois esta guerra vai durar e destruir ainda muitas vidas. E nós vamos esquecer depressa as boas intenções e regressar rapidamente às nossas vidas em que o medo do outro e o preconceito são reis.
A não ser que também façamos parte da destruição. E mesmo na dor e no sofrimento, a solidariedade é uma rara ocorrência.
A reacção do PCP à invasão da Ucrânia pela Rússia é inqualificável.
Afinal, aquela voz interior que sempre me murmurou ao ouvido que a aliança entre o PS e o PCP era estranha e contra natura, pois o PCP é um partido com tiques antidemocráticos e o PS é um partido fundador da democracia, tinha razão.
Na verdade aquilo que pensei ser passado voltou a grande velocidade - a cegueira ideológica do PCP que, para defender o indefensável, não se envergonha de negar as evidências.
E por isso eu própria me envergonhei. Durante os últimos seis anos esqueci esses mesmos tiques antidemocráticos e aceitei um governo apoiado pelo partido que defende Putin e o passo de gigante que deu para um conflito armado mundial.
Realmente é preciso traçar linhas vermelhas. E o PCP ultrapassou-a.
Acordámos hoje para uma realidade que não acreditávamos pudesse acontecer.
Para mim é muito difícil não estar assustada. Sabemos como e quando as guerras começam mas não sabemos quando e como acabam.
Lembramos a incredulidade das I e II Guerra Mundiais, os acontecimentos que ninguém julgava possíveis, o agudizar de conflitos em que ninguém acreditava.
Não sou crente. Não tenho fé na boa vontade dos Homens nem na bondade de um Deus inexistente.
As urnas estão abertas até às 19h00. Ainda tem tempo.
Não se atrase. Mais tarde está mais frio. E pode preparar a sua noite eleitoral.
Computadores e televisões a postos, umas coisas para trincar, outras para bebericar, e gente com quem discutir.
Não se atrase. É tempo de ir votar.
Está um dia lindo.
Pode começar com uma saudável caminhada, em direcção à mesa de voto.
Pode continuar com um saudável convívio social, encontrando pessoas e vizinhos que não vê desde o último acto eleitoral.
Pode depois fazer uma almoçarada cheia de quinoa e alface, abacate e semelhantes iguarias gastronómicas, acompanhadas de vários sumos detox, com amigos e familiares, onde discutirá a salvação do mundo.
Pode ainda acabar o dia a comemorar ou a suspirar, com champanhe ou imperiais, vaticinando brilhantes ou negros futuros.
Há lá perspectiva mais aliciante que esta!
Podemos ir ao https://www.recenseamento.mai.gov.pt/
Ou escrever um SMS (grátis) para o número 3838 escrevendo:
RE xxxxxxxx xxxx/xx/xx
número do BI ou CC
data de nascimento em formato AAAA/MM/DD
(*) Título de uma extraordinária canção de Sérgio Godinho, aqui pelos Clã.
Votar é seguro.
Não haverá pestes que nos peguem nem que espalhemos. Não haverá alienígenas nanométricos que nos matem, nem que nos empapem o cérebro.
Depois da inexcedível reflexão a que estamos sujeitos, grave e alegremente omnipresente no dia de hoje, mesmo para quem já votou, que pode sempre reflectir em como devia ter votado de outra forma, podemos pegar no escafandro e ir exercer o nosso direito e dever.
Podemos munir-nos de canetas, máscaras, viseiras, chapéus, luvas, mantas, plásticos, podemos levar biombos, o que melhor impedir de deixar o medo entrar.
Que o medo é bem mais perigoso que vírus, bactérias ou fungos. O medo é o que mais rápida e profusamente nos domina.
O medo mina a democracia.
Ao Voto!
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