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No dia em que perder este cansaço
em que a angústia e a solidão
não forem mais que um barco afundado
poderei enfim desatar os soluços
e a terra onde me afundar será mais serena.
Santo António de Lisboa
Vem cá ver o que isto é
Comer sardinha com broa
Beber vinho e água-pé
Não há febra nem sangria
Que nos cure a tradição
De lamentar a alegria
E louvar a maldição
Dar vivas ao vento agreste
Cantar como quem aguenta
Implorar ao pai celeste
Aprumo nesta tormenta
Somos bravos pacifistas
E guerreiros de um só dia
Solitários saudosistas
Bêbados de poesia
Oh meu querido santinho
Quero que sejas meu par
Ampara-me no caminho
Que ainda me falta andar
Peech Bubble XII
Discursam discursos
Orelhas de abano
Cornetas de guerra
Orelhas de terra
Não saem da boca
Os dados quadrados
Movem-se na boca
Os sons desbotados
Discursos discursam
O povo envelhece
Palavra a palavra
O povo empobrece
Nesta carta que te escrevo
Com tantas letras de espanto
Abro os dedos com enlevo
Como os versos que te canto
Mas a voz que me emudece
Numa angústia esculpida
Confiança que estremece
Como folha ressequida
Não aprende a esvoaçar
Enfrentando a ventania
Que pressinto nesse olhar
Que desfaz a poesia
Recolho então de mansinho
E dissolvo-me no ar
Das palavras faço um ninho
No vazio que é amar
Erosion
Nunca será demais a palavra que se cala
perante a dor do desencontro
o fundo e inexplicável vazio do desamor.
Cristo morto
Cristo vai morrendo serena
e diariamente sem remédio nem retorno
dos pecados que o mundo lhe oferece
na eternidade da paixão que ressuscita.
Entre pedras tumulares e gritos de espanto
Cristo morre e levita
sem sentido nem perdão
atraiçoado pela fé que em si e em nós
deposita.
De mulher temos os ramos
por onde trepam angústias e segredos
e sofremos os ninhos
remendando asas e nuvens
de rosas e espinhos.
Garden of Promises
Quero todas as flores.
Mas também podem ser só as brancas
ou só as vermelhas aquelas das cores
que se demoram.
Ou só mesmo uma única
como única é a haste que nos equilibra
de pétalas livres e redentoras.
Que seja apenas a flor que tens no riso
ou nas pálpebras cerradas de quem sonha.
Quero tudo o que na sua simplicidade
de abandono e paz
nos amanheça e nos inunde de esperança.
Considera-se o mundo bem aberto
Em baixo o céu que não pertence
A ninguém nem ao mundo
Nem à terra que acontece em grãos e fumo
Nem sequer aos corpos que inventam caminhos
E lutas e selos e alianças de sangue
Considera-se a mão atrás de outra
Dedos sugando a fome de amar procuram
A morna quietude da companhia que se cruza
Entre o hábito e o novo que se escusa
E se descobre na pequena faísca do olhar
Luminosos dias de um início.
Nascemos a cada instante para o mundo
que fizermos os abraços que tanto
nos faltam a esperança que nos dá
vida.
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