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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
Não sei se é resultado da pandemia se é apenas do passar dos anos e do encolher do corpo, das ideias, do mundo à nossa volta, do ensimesmamento a que nos votamos, da cada vez maior incapacidade de cumprir o assumimos como dever, a verdade é que sinto um cada vez maior isolamento.
A todos os níveis – familiar e profissional – e com todas as gerações. Vamos trocando mensagens, alguns telefonemas ou vídeo conferências, mas a vontade de estar junto, os abraços que foram banidos do nosso quotidiano, a moralização da pandemia com a instalação da culpa, tudo contribui para que estejamos cada vez mais sós.
E por isso as raras ocasiões em que se quebra esse hábito, viciante e desolador, fica um gosto bom de aconchego e carinho, aquele sentimento que perdura quando estar com alguém é um bem muito importante.
E como acontece desde tempos imemoriais, as refeições são uma boa razão para o convívio, a troca de ideias, o riso, a partilha de histórias. Começa-se por uma sangria de champanhe com frutos secos, continua-se com uma sardinhada, um naco na pedra, uns lagartos grelhados, os diversos e profusos brindes com os obrigatórios copos a baterem uns nos outros, melodia inconfundível de um almoço entre amigos.
Vivemos tempos em que aquilo que é mais essencial ao Homem, a sua sociabilidade, a sua necessidade de amar e ser amado, o toque das mãos, o sorriso, o olhar, a expressão facial, é agora uma memória que teima em ser enterrada, em nome de uma assépsia e de uma incrível nova ordem da esterilização da pele, do ar, do mundo.
Para além das ameaças bem reais que nos cercam, fabricamos mais medo e terror para nos transformarmos em gente que não se atreve a amar e que já se esqueceu do que era pensar nos outros e não em si mesmo.
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