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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
Cristianismo e judaísmo, o cristianismo como a origem do anti-semitismo, a Bíblia como a palavra de Deus, a Bíblia como as palavras dos Homens sobre as interpretações de Deus, do Deus dos Judeus, do Deus dos Cristãos. Jesus como Homem, Jesus como Deus, Jesus como Homem e Deus, Jesus como corpo humano habitado por Deus, Jesus como Homem escolhido por Deus.
Os textos da Bíblia, os Evangelhos Canónicos, Gnósticos, Apócrifos, a forma como são diferentes mesmo quando narram episódios semelhantes à luz do que os autores pretendem transmitir, a transformação da figura de Jesus de um judeu que ensina a Lei de Moisés no Messias (em grego Cristo), aproveitando do Livro todas as passagens em que se fala no Messias, transpondo-as para a narrativa da vida de Jesus.
O nascimento do Catolicismo com a férrea disciplina, hierarquização e centralização do poder, o Código de Niceia, Constantino e a religião do Estado, a ortodoxia e a heresia.
Jesus, Interrupted: Revealing the Hidden Contradictions in the Bible (And Why We Don't Know About Them) – de Bart D. Ehrman, um excelente livro para compreendermos o que foram o crescimento e a implantação do Cristianismo e do Catolicismo, e de como o conhecimento e a informação são os melhores antídotos contra os fundamentalismos e as ideias feitas – como o celibato obrigatório dos Sacerdotes, a submissão das mulheres aos homens e o anti-semitismo.
Bem sei que o disparate é democrático e livre, mas convinha que o Vaticano deixasse de dizer inanidades. Afirmar-se que há uma relação entre a homossexualidade e a pedofilia, como o fez (a acreditar no Público) Tarcisio Bertone, ou é ignorância ou desonestidade. Nenhuma delas é admissível.
Nem sequer consigo perceber que cortina de fumo ou que desvio de atenção possa ser o objectivo de declarações deste calibre. É um mistério que, seguramente, não será pela fé que se resolve.
(Via Eduardo Pitta)
A Igreja Católica escondeu a pedofilia, sendo conivente com crimes durante décadas, tal como foi conivente com a violência doméstica, com os crimes de sangue e de honra, tal como foi conivente com as visões mais conservadoras e reaccionárias da sociedade, durante muitos anos.
Numa sociedade aberta como a que existe hoje, não é mais possível manter em segredo situações como estas. A Igreja perdeu influência, principalmente perdeu poder, que usou de forma autocrática e ditatorial, cobrindo tudo o que dizia e fazia com efectivos poderes terrenos e hipotéticos poderes celestes. Todos os desvios, prepotências, imoralidades e crimes praticados, anteriormente escondidos, calados e lançados como calúnia para quem tinha a coragem de falar deles, afloram agora à superfície.
A Igreja pede perdão pelos padres pedófilos. Mas o seu silêncio é um pecado pesado e longo, pelo qual não sei há penitência que a possa limpar.
Todos os domingos, às 11h00, a TSF passa O Jornal da República, um programa de Fernando Alves, interessantíssimo. Hoje falou-se da questão religiosa, tendo sido convidado o investigador Sérgio Pinto, do Centro de Estudos Religiosos da Universidade Católica.
A ideia republicana de laicização do Estado, ao contrário do confessional que então existia, em que os elementos do clero eram seus funcionários, assegurando o registo civil e até o recrutamento militar, não era totalmente renegada pela Cúria Romana, visto que estava em curso uma reorganização da Igreja Católica, com vista a uma maior autonomização da Igreja em relação ao Estado.
Para os republicanos o fenómeno religioso iria desaparecer, competindo ao Estado a tutela sobre o cidadão, sendo também o elemento de ligação entre os cidadãos, a componente que cimentava a sociedade, e não a religião.
O Episcopado português nunca discutiu o regime republicano mas sim as suas leis, nomeadamente a Lei da Separação da Igreja e do Estado. A Pastoral Colectiva do Episcopado Português ao Clero e Fiéis de Portugal foi a reacção da Igreja, chegando Afonso Costa a proibir a sua leitura nas Igrejas.
Por outro lado houve um ataque ao poder das Congregações, que vinha já do período da Monarquia Constitucional, reduzindo-lhes a influência na sociedade, nomeadamente vedando-lhes o acesso ao ensino, e proibindo a religião nas escolas.
O investigador Sérgio Pinto é de opinião de que, mais do que a perseguição religiosa a que se assistiu na Primeira República, havia uma enorme violência na sociedade portuguesa no princípio do século, visível na repressão do movimento operário e em toda a actividade política.
Por fim foi contada a história de uma figura que ficou na memória colectiva do povo do Fundão e de Coimbra – Alberto Costa ou o Pad' Zé, objecto de investigação de João Mendes Rosa.
O Pad' Zé estudou 3 anos no colégio de S. Fiel, no Fundão, fez o curso de Direito na Universidade de Coimbra, onde se distinguiu pelas suas ideias monárquicas. Posteriormente foi para Lisboa, ter-se-á tornado membro da Carbonária e aderido aos ideais republicanos (a sua menina). Era um homem bem-humorado e generoso, havendo vários ditos populares a seu respeito, nas regiões do Fundão e de Coimbra. Era corajoso, amigo de vários caudilhos republicanos como Afonso Costa e Bernardino Machado, não alimentando ilusões sobre as suas ideologias, reconhecendo o autoritarismo e o conservadorismo dos mesmos, idênticos aos dos monárquicos. Foi encontrado morto no seu gabinete (era redactor do jornal O Mundo), não se sabendo se foi suicídio ou não.
Enfim, um excelente programa que vale a pena seguir nas manhãs de Domingo.
A burca é um símbolo de submissão da mulher, é um símbolo de discriminação e de identificação religiosa. A burca é uma mistificação fundamentalista, um ferrete de menoridade e de reduzida cidadania.
Concordo com todas estas frases. Mas não concordo com a proibição do uso de burcas. Não é possível assegurar que algumas dessas vestes não sejam usadas por escolha livre e despoluída de lavagem cerebral. Tal como não concordaria com a proibição do bikini, dos piercings ou da impossibilidade de uso de calças pela mulher. Tal como não concordo que impeçam as freiras de usarem o seu hábito nos edifícios públicos, como escolas e universidades.
Tal como não concordo com a reivindicação de alteração de normas e de horários por causa dos burkinis. Tal como concordo com a obrigação de todas as crianças irem à escola. Independentemente da raça, etnia, cultura, naturalidade, etc., todos os cidadãos devem seguir um plano nacional de vacinação, enfim, sujeitarem-se à legislação do país onde vivem.
Proibir o uso da burca pode ser tão fundamentalista como proibir o uso de crucifixos ou da circuncisão masculina.
Não percebo porque é que um grupo de socialistas católicos pretende um referendo sobre o casamento entre homossexuais.
Caso este seja legalizado, será o casamento civil. O casamento religioso será sempre conforme os preceitos da religião, neste caso os da Igreja Católica. Ou será que querem referendar a hipótese de haver casamento religioso para homossexuais? Pois, mas para isso não serve um referendo.
Os católicos ofendem-se com frequência e tendem a pretender que todos sigam as suas ideias, os seus valores, as suas escolhas.
O programa do governo era explícito nessa matéria e essa já foi sufragada. Caso seja legalizado o casamento entre homossexuais, ninguém será obrigado a ser homossexual, ninguém será obrigado a casar. Apenas se abrirá a possibilidade de dois cidadãos do mesmo sexo celebrarem um casamento civil.
Um referendo pedido por um grupo de católicos? Não percebo.
Nota: também aqui.
pintura de Gustave Doré
A morte de Abel
Génesis
Capítulo IV
Bíblia Ilustrada, tradução de João Ferreira Annes de Almeida; apresentação e fixação do texto: José Tolentino Mendonça; ilustrações: Ilda David; Assírio & Alvim
Caim (lança) o primogénito, talvez o preferido de Eva, Caim o lavrador, aquele que faria o bem para que fosse recompensado, aquele que ferveria de ciúmes perante Abel (nada), que era crente e solícito, que era bom.
Caim, aquele que escolheu o mal, aquele que pecou, aquele que foi condenado a prisão perpétua e não à morte, o que fugia de Deus e da voz do sangue do seu irmão, aquele que viveu a leste do Paraíso.
Caim, o escolhido por Deus como exemplo, o escolhido de Deus como sinal do lado negro do homem, o escolhido por Deus como prova. Caim, o sacrificado por Deus.
Esta história é uma história de humanidade e desumanidade, de amor, paixão, ciúme e morte, de condenação sem perdão. É uma história de sempre. Crentes, ateus ou agnósticos, há nestes livros uma profunda reflexão sobre nós, como nos vemos, como nos relacionamos, como nos amamos. Podemos sempre interpretá-los de forma literal, mas perderemos um manancial de informação sobre a nossa própria memória ancestral, os nossos medos e os nossos mitos.
No programa do PSD podemos ler esta frase:
Este recuperaremos é intrigante, ou talvez não.
A Constituição Portuguesa diz:
Artigo 13.º
(Princípio da igualdade)
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual. (...)
A Lei da Liberdade Religiosa estipula que:
Artigo 2.º
Princípio da igualdade
1 - Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, perseguido, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever por causa das suas convicções ou prática religiosa.
2 - O Estado não discriminará nenhuma igreja ou comunidade religiosa relativamente às outras.
Artigo 3.º
Princípio da separação
As igrejas e demais comunidades religiosas estão separadas do Estado e são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto.
Artigo 4.º
Princípio da não confessionalidade do Estado
1 - O Estado não adopta qualquer religião nem se pronuncia sobre questões religiosas.
2 - Nos actos oficiais e no protocolo de Estado será respeitado o princípio da não confessionalidade.
3 - O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes religiosas.
4 - O ensino público não será confessional.
Finalmente, o governo regulamentou a Concordata (2004) e a Lei de Liberdade Religiosa (de 2001), assumindo a laicidade do estado e a igualdade de direito à assistência espiritual de todas as confissões religiosas
O que quer o PSD recuperar? A contratação dos assistentes religiosos pelo Estado? A inexistência de igualdade de direitos no que confere a assistência espiritual, regressando à hegemonia da Igreja Católica?
O programa do PSD aposta em retroceder naquilo em que foi possível, às vezes com grande esforço, avançar.
Nota: Também aqui.
Este editorial do The Lancet, ao qual tive acesso através do blogue A Natureza do Mal, demonstra bem a enormidade e a irresponsabilidade do Papa Bento XVI:
Tal como já escrevi num post anterior, não há fé que justifique uma mentira nem ignorância que se desculpe ao Papa sobre esta matéria.
Que a Igreja perfilhe os valores da fidelidade conjugal, da abstinência sexual, da procriação e a anticoncepção natural (??), pregue e evangelize as populações, é um direito que lhe assiste. Só a segue quem quer.
Mas que afirme que Não se resolve o problema da sida com a distribuição de preservativos. Pelo contrário, o seu uso agrava o problema. é desinformação, cujas consequências poderão ser desastrosas.
A prevenção é sempre melhor estratégia do que apenas a terapêutica, para qualquer doença. Para uma doença infecto-contagiosa, evitar a exposição e, quando isso não é possível, proteger quem pode estar em risco (todos podemos, é importante não esquecer isso) são as melhores alternativas.. É essa a filosofia das vacinas, da poliomielite ao HPV, da Hepatite B à tuberculose.
O preservativo é um método de barreira comprovadamente eficaz na redução da infecção por HIV.
Não se pede ao Papa nem à Igreja que neguem os seus valores ou que desistam dos seus conselhos. Mas não se pode tolerar o engano objectivo e premeditado das populações. A fé não pode ser desculpa para a exploração da ignorância alheia.
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