Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]
Meço o tempo pelas palavras/ cada vez mais curtas/ cada vez mais escassas/ cada vez mais duras/ instalando-se o silêncio/ nesta doce melodia/ do esquecimento.
Olho para as imagens das várias manifestações com um misto de emoções. Por um lado a satisfação de ver que tanta gente se mobilizou. Por outro a certeza do meu divórcio com a repetição destas palavras de ordem, com a mescla de razões e motivações, com o apelo ao que de mais primário nós temos, com o uso e abuso do conceito de sociedade civil. Comovem-me as histórias que ouço, revolta-me a estupidez e a crueldade da política deste governo. Mas lembro-me muito bem das últimas eleições legislativas em que o povo, livremente, deu a maioria a esta coligação. E se fosse chamado a votar agora, muito provavelmente o resultado seria semelhante.
Não tenho a ilusão da mudança do governo. Tenho é esperança que tenha algum respeito pela que pode acontecer - a resistência passiva, a pequena fuga diária aos impostos, o aumento do desespero que leva aos desacatos e à violência primária a que temos assistido ultimamente, a desistência total que quebre os ânimos, o afundamento da economia e o aumento da recessão.
O Presidente resolveu dar um sinal ao convocar o Conselho de Estado. Perante a gravidade da situação aguardo uma centelha de bom senso por parte de Passos Coelho. E espero que o Presidente nos surpreenda e assuma as suas responsabilidades. A troika não pode ser a desculpa do descalabro a que assistimos.
Os partidos políticos são os veículos para a representação dos cidadãos. Diabolizar os políticos, os militantes e o regime pluripartidário é perigoso. As acusações populistas de gatunos que se ouvem e se usam como bandeiras, as manifestações agora conhecidas como inorgânicas, tão aplaudidas por responsáveis políticos, jornalistas e anónimos cidadãos, não são mais puras do que as convocadas por partidos ou por centrais sindicais e não são alternativas aos partidos. Até hoje, e apesar de todos os seus defeitos, este é o melhor regime, com assembleias constituídos por deputados eleitos, com formação de governos por gente que venha dos partidos, ou das empresas, ou das academias, ou dos sindicatos.
Olho para o dia de hoje com um misto de pena por ter perdido a capacidade de acreditar que esta revolta signifique mudança.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.