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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
Se há alturas em que os funcionários públicos especialmente e toda a população em geral têm razões fundadas para protestar e fazer greve, é esta. Estamos a viver uma crise económica, financeira e social gravíssima, temos um governo que foi eleito com base em falsos pressupostos, que tem feito exactamente o contrário do que apregoou, que está a implementar, sem oposição, o programa mais ideologicamente à direita desde o 25 de Abril, delapidando valores de equidade e justiça fiscal, igualdade de direitos fundamentais e destruição de conceito de Estado e de Serviço Público. Tudo isto numa Europa num crescente de autoritarismo e subversão dos valores democráticos, em que os governos e os povos são manietados e chantageados pel'Os Mercados e pela todo-poderosa Alemanha.
Eu sinto-me entre duas realidades que me assustam. Por um lado a necessidade e a vontade de protestar, de manifestar o meu desconcerto, desapontamento, a total desaprovação de tudo o que se passa e firme convicção de que tudo vai piorar. Por outro a certeza de que as manifestações a que assistimos neste último sábado, anacrónicas, repetitivas, iguais às que têm sido organizadas pelas mesmas estruturas sindicais anquilosadas, com as mesmas palavras de ordem, com os mesmos oradores, a dizerem as mesmas coisas que têm dito em todos os governos, de direita ou de esquerda, fossem quais fossem os partidos e as políticas seguidas, com as mesmas músicas de intervenção, importantíssimas e ícones de uma outra realidade, de um outro tempo, de outras gerações.
Mas se não me revejo na irrelevância destas acções de protesto, a que já ninguém dá crédito, tal como a greve geral marcada para 24 de Novembro, que tem toda a razão de ser, não fora o manancial de greves gerais marcadas pelos motivos mais disparatados, e pelo facto de ter a sensação de que quem mais tem a perder são os próprios trabalhadores em greve, ainda menos me revejo nas manifestações dos indignados, em que a pulsão antidemocrática e populista me repugnam.
Na terra de ninguém estou pior que o tempo invernoso, céu pesado e de chumbo, chuva forte e vento louco, numa temperatura amena de fim de época, humidificando e parasitando a nossa mente.
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