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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
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No cruzar do século temos os mesmos níveis de analfabetismo que outros países tinham no cruzar do século anterior. Quando se diz que tivemos de, em algumas décadas, recuperar de um atraso de 100 anos, está-se a ser literal. Nem um quinto da população ativa havia terminado o ensino secundário. Nem um quinto. A percentagem da população ativa com ensino secundário na Europa era três vezes maior. Nos países de Leste, como a Chéquia, Estónia, Eslovénia ou Polónia, era quatro vezes maior. É assim tão surpreendente que estes países, uma vez aderindo à União Europeia, crescessem bem mais depressa do que nós?
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A grande revolução deu-se nos números relativos ao ensino superior. Em 2000, nem 9% da população ativa tinha completado um grau superior. Em 2022 esse valor subiu para 31,5%. Mais do que triplicou e põe-nos próximos da média europeia e à frente de nove países. É uma recuperação extraordinária. E, se olharmos especificamente para as faixas etárias entre os 20 e os 34 anos, concluímos que já estamos acima, e bem acima, da média europeia.
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Mas quando olhamos para fatores endógenos, em especial para o mais importante de todos, o capital humano, temos razões para sermos otimistas.
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Não me entendam mal, é evidente que nos desenvolvemos muito. Temos um bom sistema de saúde nacional, uma boa rede de escolas, proteção social eficaz, etc. Mas, insisto, o nosso nível de bem-estar ainda está longe do da Europa. O que os dados sobre a educação mostram é que nunca estivemos tão bem preparados para alcançar o terceiro ‘D’ de Abril. Ser-se realista é ser-se otimista.
Difícil não me comover neste dia, olhando para a Assembleia da República engalanada de cravos vermelhos, a casa de uma Democracia inaugurada há 50 anos.
Difícil não me lembrar da invencível esperança na felicidade que aí vinha, com a concretização dos sonhos e dos desejos de quem menos tinha.
Tão difícil, este meu País, cantado por poetas e gritado pelo Povo em euforia.
País imperfeito, mas onde estes 50 anos, ao contrário dos saudosistas do antigo regime, dos demagogos e dos falsos puros, tanto conseguiu, nos direitos de todos à saúde e aos apoios sociais, nos direitos das mulheres, conquistados muitas vezes a ferros, no fim de uma guerra colonial que defendia um Império que não existia, no estabelecimento de laços com a Europa, na defesa das minorias e do amor, seja ele como e com quem for, enfim, no viver em Liberdade.
Difícil, esta Liberdade, nunca perene, nunca certa, nunca segura, sempre necessitando de ser construída e acarinhada. Difícil a tolerância.
Neste dia em que me comovo ao olhar para os rostos dos protagonistas de 1974, talhados pelo tempo e pelo seu tempo, olho para o futuro aninhado ao meu lado, dedinhos quentes que me seguram a alma, e sei que tudo farei para que os seus próximos 50 anos sejam aqueles da sua Liberdade.
Abraçar alguém, homem ou mulher ou qualquer dos géneros alternativos, grande, pequeno, escuro, claro ou às cores, de qualquer nacionalidade, ter alguém que amamos, alguém que beijamos infinitamente.
Ter momentos em que nos juntamos, rimos ou sofremos, apoiamos ou discutimos, de felicidade, raiva, estremecimento ou distanciamento, ter alguém de pequenino que nos olha e apreende, que nos cheira, com o corpinho morno junto ao nosso, que nos dilata e preenche o coração, que nos inunda de ondas de amor.
O amor, sempre o amor. Amar alguém é a nossa mais preciosa característica, e não a temos que justificar a ninguém.
Família é a que temos, biológica ou não, constituída por aqueles que escolhemos, sejam quem forem, de onde forem, como forem, estejam aonde estiverem, melhor bem junto a nós.
E ninguém tem absolutamente nada a ver com isso.
Women’s Rights Pioneers Monument
É pesado.
Vamos assistindo àquilo que considerávamos valores universais, de civilização, civismo, direitos, liberdade e garantias, no sei de um mundo que se ia desenvolvendo.
Mas não. Nos EUA, preparam-se novas proibições às leis do aborto. Por toda a Europa, o revivalismo, o reaccionarismo e a forma despudorada com que se tem ouvido cada vez mais gente a defender o retrocesso a ideias ultramontanas, sendo muito difícil fazer frente a essa situação.
Não é o facto de as poderem defender que está em causa. A democracia é isso mesmo. Mas a descoberta de que há tantos a defenderem estatutos de dona de casa, a sensibilidade maior da mulher, papéis distintos para homens e mulheres reescrevendo tudo o que se passou nos últimos 100 anos, já não digo 50 anos, a lavagem cerebral quanto ao que apelidam ideologia de género, a obrigatoriedade de seguir padrões comportamentais e ideológicos, a negação da pluralidade de soluções e de vontades de afectos, é assustadora.
Por outro lado, ao fim de 2 dias de discussão do programa do governo, descobrimos que a promessa da redução do IRS feita pela AD era, pura e simplesmente, mentira, descarada e saloia, é deprimente.
São ares dos tempos.
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