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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
Maria Helena Vieira da Silva
Vou florir na avenida
De cravos brancos ao peito
Que o encarnado da vida
Trago de vestido inteiro
Vou cantar na avenida
Os sonhos da liberdade
Que a canção da minha vida
Vai gritando a realidade
Vou correr pela avenida
Atrás da felicidade
Que esta profunda corrida
Nunca passa da metade
Vou marchar na avenida
Com bandeiras sem idade
Que não me dou por vencida
Na manhã da eternidade
Atraiçoada é exactamente o sentimento que define o que, durante algum tempo, senti em relação a José Sócrates.
Fui eleitora de Sócrates para Primeiro-ministro nas duas eleições em que ganhou, primeiro em maioria absoluta e depois em relativa. Defendi as políticas de saúde e de educação dos seus governos, as opções estratégicas pelas energias renováveis, a aposta na literacia digital e nas tecnologias de informação. Ainda hoje defendo tudo isto.
Indignei-me com as manipulações políticas, as falsas acusações, as fugas de informação, a inacreditável forma como foi preso em directo. Tudo o que escrevi sobre o assunto, mantenho.
No entanto foram as suas palavras, as suas justificações, as suas alegações e as suas mentiras que me deixaram boquiaberta, que me deixaram indignada de novo, mas com a minha própria ingenuidade. Como me foi possível, a mim e a tantos outros, sermos tão redondamente enganados pela sua personalidade? É claro que fiz e faço um julgamento moral da sua pessoa, do seu carácter, e da sua falta de vergonha para afirmar que foi afirmando.
E por isso, se calhar como tantos outros, me senti atraiçoada naquilo que, para mim, era uma questão de honra, de probidade de quem nos governa. Não é preciso santidade nem virtudes robóticas e enganosas. Nunca confiaria em alguém sem mácula nem vício, porque as pessoas são uma mescla de tudo e tudo é necessário para se ser inteiro. Mas afirmar que se sente atraiçoado pelo partido parece-me uma tal forma de alheamento da realidade, de desconhecimento da sua própria pessoa, para não dizer de desfaçatez e falta de vergonha, que me custa a entender.
Não é fácil admitir perante nós próprios as nossas fraquezas e defeitos, as nossas ingenuidades e faltas de sagacidade. Mas não é possível fingir que as somas em dinheiro vivo trocadas entre Sócrates e o motorista, as justificações sempre diferentes da proveniência do dinheiro, primeiro da mãe, depois do amigo, o facto de guardar obras de arte em casa dos empregados, enfim, tantos e tão profusos disparates debitados ao longo destes anos que a ninguém convencem.
A Justiça tem o seu papel e ninguém deve ser condenado em praça pública. O que se passou e passa no caso do ex-Primeiro-ministro é um susto para qualquer cidadão. Mas não podemos fechar os olhos e os ouvidos ao que o próprio nos ofereceu e oferece. E não é bonito. Não são estas as características que desejo para alguém que nos represente e governe.
Ao fim de 7 anos de prisão em directo, fugas de informação, escutas e julgamento na praça pública, o Juiz Ivo Rosa destroçou as acusações do Ministério Público, muitas delas já prescritas aquando da acusação. Culpado ou inocente, ninguém merece que isto lhe possa acontecer.
É tudo muito mau, seja qual for o ângulo pelo qual se tente olhar.
Nem José Sócrates e os outros acusados saem ilibados dos crimes de corrupção, nem o Ministério Público sai ilibado de incompetência. Os populismos têm uma época cheia, destilando o ódio aos políticos, aos magistrados, aos juízes, a tudo e a todos.
Ninguém se pode sentir seguro com uma justiça que funciona desta forma. A democracia está mais frágil.
Um dois três
quatro cinco seis
vamos ter festa
e não é de Reis.
Sete oito nove
dez onze doze
amêndoas não tenho
que ninguém as trouxe.
Treze catorze quinze
dezasseis dezassete dezoito
mas em vez delas
comprei um biscoito.
Dezanove vinte vinte e um
foge cabritinho
que já estás gordinho.
Vinte e dois vinte e três vinte e quatro
vamos embora
que está na hora.
Já se faz tarde
nesta vidinha
o que vai dar
não se adivinha.
Besunta a forma
espreme o limão
à nossa retoma
de escravidão.
Sopra no forno
limpa a colher
que não há retorno
vamo-nos benzer.
Cristo confina
confino também
a alma definha
e fica refém
do corpo dobrado
que não se sustém.
Recolhe a esmola
que sem vintém
ninguém se consola
e esta revolta
já não se detém.
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