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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
Excertos da entrevista a Graça Freitas:
No meio da uma iminente epidemia em Portugal, causada pelo COVID-19, à falta de casos positivos para regalar os alarmismos dos títulos dos jornais, usam-se frases da Directora Geral de Saúde numa entrevista, em que fala de cenários e número de infectados na totalidade do decurso da referida epidemia.
Em tempos de crise, seja ela de saúde ou outra, a informação é a base de todas as decisões e de todos os planeamentos para minimizar os impactos sociais, económicos, etc. O rigor, a serenidade e o sentido de responsabilidade deveriam pautar as linhas editoriais dos media.
Assiste-se exactamente ao contrário. Graça Freitas tem sido clara, serena e esclarecedora. Mas nada a salva, a ela nem a ninguém, da pesca de soundbites para angariar leitores, independentemente da justeza e verdade dos factos.
Estamos preparados? Tal como o resto do mundo com sistemas de saúde organizados, como é o caso do nosso, estamos preparados para nos prepararmos. É sempre assim, com todas as epidemias, todos os anos. A contribuição tem que ser de todos, começando nas Instituições e acabando nos cidadãos. Calma e serenidade, atenção e confiança. O medo é o pior conselheiro e o mais terrível vírus de todos.
Sites informativos e fidedignos:
Direcção Geral de Saúde; Organização Mundial de Saúde
Artigo informativo: The Guardian
Swan, 2007
Há uns meses, numa das sessões clínicas a que assisti, o director da unidade de cuidados intermédios, chamou a atenção da assistência da incapacidade que temos em falar com as pessoas sobre se queriam e o que queriam caso estivessem com uma doença incurável e a aproximar-se da morte. Ou mesmo com os nossos familiares e amigos mais velhos, com quem nos é mais próximo e com quem mais amamos.
E disse-nos que, na maioria das vezes, as pessoas mais velhas e doentes queriam falar disso, esclarecer que não queriam determinado tipo de tratamentos, que queriam que os deixassem morrer em paz, sem idas repetidas aos serviços de urgência, internamentos, medicamentos, entubações, acessos vasculares, bombas de oxigénio, etc. Que, quando o conseguiam fazer, ficavam mais serenos e compensados, tinham a certeza que a sua finitude era uma inevitabilidade que eles próprios já tinham aceite e que nós nos recusamos a ver.
E perguntou mesmo quantos de nós sabiam o que queriam os nossos pais quando a morte se aproximasse. Se sabíamos dos seus preparativos e anseios, da sua preocupação com a nossa própria dor, da sua tristeza ao perceberem que fugíamos do assunto como se ele não existisse. E que essa fuga os acabrunhava mais que a decisão de deixar a morte chegar.
Nesta discussão da eutanásia ouço muitos pronunciarem-se mas pergunto-me se, dentro de si mesmos, já terão tido a coragem de enfrentar este tipo de conversas. Se, no fundo, todos esperamos que por algum decreto divino tudo seja revelado e resolvido sem que tenhamos que nos envolver.
E isso é impossível. E os nossos receios são aqueles que mais nos assombram e mais nos impedem de deixar que as decisões não sejam as nossas, mas de quem está verdadeiramente em causa.
Cada vez que sai da torre de gelo onde se esconde, Cavaco Silva descongela e corrói com o seu azedume qualquer debate sério sobre qualquer assunto - neste caso a despenalização da eutanásia.
Do alto da sua grandeza moral, que os restantes pobres mortais só terão se nascerem várias vezes, sai a lingua viperina condenando a moralidade dos deputados, exortando os fiéis a identificarem aqueles que, em nosso nome (como os eleitos numa democracia representativa), decidirem sobre este assunto.
Tal como quando se falava da despenalização do aborto, lembrando-se a indispensabilidade da educação sexual e do planeamento familiar, para além do perigo do aumento em flecha do número de abortos que se iria transformar num método contraceptivo, já se reúnem os mesmos grupos para prever a horda de assassínios de gente abandonada, lembrando a importância dos cuidados paliativos.
É um assunto difícil pois mexe com as mais íntimas concepções de vida e de morte, com o sofrimento e com a dignidade de cada um de nós. Cavaco Silva levou a discussão para o campo da culpa - exactamente aquilo que se não deve fazer.
Nota: vale a pena ler esta opinião de Alexandre Quintanilha.
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