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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
O protocolo permitia apenas um escasso número de pessoas a acompanhar cada agraciado. Atentamente e com os murmurinhos das antecipações cerimoniais, fez-se silêncio à entrada do Presidente da República.
Marcelo Rebelo de Sousa foi conciso, agradecendo em nome de Portugal (da Pátria, palavra em desuso e mal amada, mas razão de ser de qualquer militar) aos nove agraciados que deram de si o melhor pelo País.
O nome foi chamado alta e claramente, pronunciado de forma a percebermos todas as sílabas. O meu pai deu dois passos em frente e recebeu, das mãos do Presidente, a Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, colocada com cuidado, respeito e carinho. As fotografias da praxe. E ele, com um aprumo que faz parte da sua essência, da sua mais funda memória de militar, perfilou-se.
Tão pouco que somos. E tanto que alguns de nós são. Aquela figura frágil, quase etérea, perfilada e orgulhosa, segura pelo núcleo da sua vida, de frente para o destino.
Thomas Dambo
A água que escorre pelos dedos
um corpo abandonado sobre os lençóis
o cheiro da manhã
uma voz que acorda e reclama.
Como o suspiro de uma asa
o olhar aguçado do futuro
pousado ao de leve
em todas as esquinas de uma casa.
Na verdade, só agora percebeu a bênção que é não se inteirar de nada. O mundo deixou de lhe interessar. Tanto que a sua arrogância tinha para dizer, tudo o que pensava precisar de partilhar, pensamentos, sugestões, indignações, espantos, comoções, palavras, textos, poemas, notícias dissecadas, treino de costela detectivesca, desprezos, confianças, juras de fidelidade e dores de traições, nada mais lhe interessava.
A vida facilitou-se enormemente com o afastamento da mundana necessidade de estar a par dos acontecimentos. Vagueia mole e sonolentamente pelas redes sociais, observa com um olho meio fechado os títulos dos jornais, ouve de vez em quando os locutores dos canais de notícias, com aquele jeito de estar sempre a anunciar o apocalipse, os comentadores a perorar sobre as últimas colheitas e a próxima guerra intergaláctica.
O mundo não precisava da sua atenção, nem das suas análises. Pode concentrar-se na perpétua e menor actividade de passar um dia após o outro entre as paredes da sua realidade, com pedras e flores mais ou menos aleatórias. A comezinha tarefa de viver, comer, dormir, trabalhar, rir, chorar, ver séries de televisão à desfilada, ouvir música, muita música, acordar para a ginástica, discutir e planear concertos, teatro, livros, sonhar as viagens que há-de curtr.
A mediania que nasce connosco e não se encomenda, mas que se recomenda.
É dos livros mais extraordinários que li até hoje, há já muitos anos. Comovente, lindíssimo. De Altino do Tojal.
Na era das comunicações digitais, globais e internáuticas, em que a comunicação é instantânea e os segredos deixaram praticamente de existir, causa-nos uma enorme estranheza a utilização de pombos como mensageiros, ainda por cima em tempo de guerra, em que as informações são extremamente sensíveis.
E, no entanto, os pombos (especificamente uma determinada raça, os homing pigeons) foram importantíssimos para o esforço de guerra, em todos os lados do conflito, pela capacidade única de conseguirem regressar a um local de onde partiram (homing) por aquilo a que se chama magnetorecepção (capacidade de detectar um campo magnético para estabelecer coordenadas de altitude, direcção e localização). Há registos da utilização dos pombos como mensageiros militares desde o império romano.
Nas I Guerra Mundial um pombo (o Cher Ami) foi condecorado com a Croix de Guerre, pelos valorosos serviços prestados na Batalha de Verdun. Na II Guerra Mundial a Dickin Medal foi atribuída a 32 pombos.
Mesmo neste século ainda há notícias de pombos usados em comunicações militares. É extraordinária a capacidade do Homem em colocar a natureza ao seu serviço, transformando os animais em extensões das suas necessidades.
Crescent
Os teus olhos as tuas mãos
as vozes no rumor do começo.
Onde estou agora? Por onde
passaram os dias que me espreitam
de longe? Ecos de uma vida
que já não reconheço.
Anne Sofie von Otter
J. S. Bach - Matthäus-Passion
Papoilas de cerâmica
Da janela enfrento as nuvens dentro da redoma do esquecimento.
Espero o vagar do sono os gestos do descanso a que me obrigo
aplicadamente para suster a respiração. As bandeiras
deixaram a cor empalidecer e os hinos estão calados. Amanhã
acordarei a alma por eles.
Gassed
All a poet can do today is warn. That is why the true poet must be truthful
A poesia é um dos grandes testemunhos da I Guerra Mundial. Muitos dos poetas eram jovens que combateram e morreram nas batalhas ou como consequência delas. A poesia foi um meio de expressarem o seu medo, a sua fúria, a sua tristeza, a sua vulnerabilidade. Transformaram-se nas vozes das consciências dos povos, pela sua comovedora sinceridade e honestidade, numa linguagem que se desligou de artificialismos formais e nos aproxima do sofrimento, da amizade e da solidariedade.
Muitos foram os que publicara os seus poemas durante a Grande Guerra, havendo inúmeras antologias já do pós-guerra.
IN FLANDERS FIELDS
In Flanders fields the poppies blow
Between the crosses, row on row,
That mark our place; and in the sky
The larks, still bravely singing, fly
Scarce heard amid the guns below.
We are the Dead. Short days ago
We lived, felt dawn, saw sunset glow,
Loved and were loved, and now we lie,
In Flanders fields.
Take up our quarrel with the foe:
To you from failing hands we throw
The torch; be yours to hold it high.
If ye break faith with us who die
We shall not sleep, though poppies grow
In Flanders fields.
THE DEAD
These hearts were woven of human joys and cares,
Washed marvellously with sorrow, swift to mirth.
The years had given them kindness. Dawn was theirs,
And sunset, and the colours of the earth.
These had seen movement, and heard music; known
Slumber and waking; loved; gone proudly friended;
Felt the quick stir of wonder; sat alone;
Touched flowers and furs and cheeks. All this is ended.
There are waters blown by changing winds to laughter
And lit by the rich skies, all day. And after,
Frost, with a gesture, stays the waves that dance
And wandering loveliness. He leaves a white
Unbroken glory, a gathered radiance,
A width, a shining peace, under the night.
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