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Cada um cumpre o destino que lhe cumpre. / E deseja o destino que deseja; / Nem cumpre o que deseja, / Nem deseja o que cumpre. [Ricardo Reis]
Não sei quantos foram mas foram muitos os que passaram uma tarde de chuva, vento e frio ao relento, pela Avenida da Liberdade abaixo. Aqui fica um foto da Ana Vidigal com uma pequena amostra do longo desfile.
Não deixa de ser interessante e digno de estudos posteriores a capacidade de algumas pessoas, como Lobo Xavier, na Quadratura do Círculo, fazerem piruetas verdadeiramente acrobáticas. De repente até a pobreza se reduziu, neste país que agora é um paraíso e há u ano um lodaçal socrático. As energias renováveis passaram a ser uma vitória, a aposta na educação uma verdadeira revolução.
Do nosso Presidente não vale a pena falar. A apologia do optimismo que dantes era uma quimera hipócrita é agora um desígnio nacional.
No entretanto vamo-nos apagando, enrugando e enrolando. Este mês de Abril é mesmo a metáfora atmosférica do que somos.
Há 38 anos mudámos. Em revolta e pela revolta de uns quantos, pela alegria e descompressão de todos os outros, pudemos encher as ruas e clamar por liberdade, celebrar a democracia, terminar a desgastante, longa e anacrónica guerra colonial, iniciar o desenvolvimento no contexto de uma sociedade aberta, solidária e europeia.
Nestes 38 anos assistimos à credibilização do trabalho parlamentar, pois tivemos e temos eleições livres, à normalização do debate de ideias, depois das tentativas totalitárias do primeiro ano da revolução, ao revolucionário hábito de podermos exprimir livremente a nossa opinião, ao inalienável direito de sairmos à rua com cartazes ou com as nossa vozes, gritando e cantando o que nos vai na alma.
Saímos da nossa realidade aprisionada entre fronteiras, colhemos e desenvolvemos a nossa identidade além geografia de quase ilhéu. Somos o que somos, fadistas e aventureiros, tímidos e corajosos, ordeiros e tumultuosos, preguiçosos e cumpridores. Sofremos com as nossas dores e pelas nossas mãos, mas também pelas dores desta Europa que se desfaz e pelas mãos dos donos do mundo, que não têm rosto nem endereço postal, físico ou electrónico.
Fizemos muito e temos muito para fazer. Não temos que temer a mudança nem as ideias. Mas as montanhas a mover são infinitas e a felicidade absoluta é utópica. Este é um dia de festa e de ritualização quase sagrada, em que as graças que damos e os votos renovados são os da liberdade, os do empenhamento no viver democrático, na justiça, na paz social, no bem-estar, na solidariedade. Em casa, no Parlamento, nas ruas, por onde quisermos e for preciso, cantar Abril é afirmar a nossa inalterável presença enquanto cidadãos de Portugal.
Passos Coelho, mais uma vez, perdeu uma excelente ocasião de estar calado. A falta de respeito que demonstra pelos fundadores da democracia é patética., parafraseando Irene Pimentel, com quem não estou de acordo quanto à avaliação das ausências já comentadas.
Filho do 25 de Abril, sim, com a pesporrência e a arrogância dos incrivelmente ignorantes.
Miguel Portas foi um homem que sempre lutou por aquilo em que acreditava. Tinha uma força que lhe vinha das suas profundas convições. Serviu o País em vários momentos e em várias circunstâncias. Devemos-lhe uma merecida homenagem.
Passo a passo, percebe-se que as promessas prometidas pelo Passos se processam apenas a passo. Porém, apesar dessa posposição, a passo e passo, há outros passos que, não sendo promessas passadas, são-nos passadas pacientemente pelo Vítor Gaspar e aceites penosamente perante a passividade e a permissividade da nossa sociedade. Parece um péssimo prenúncio. Por isso, a espaços, ainda há quem se expresse possesso, pese o peso desse protesto (ideológico), já ter passado do prazo. Prosseguindo-se este processo, ampliam-se as possibilidades para o desaparecimento da paz social presente. Perceberá o Passos o que se prepara?
O 25 de Abril devolveu a liberdade e instaurou um regime democrático em Portugal. A Assembleia da República é o órgão onde, diariamente, se pratica a democracia. É uma vergonha que personalidades como Mário Soares e Manuel Alegre caiam na tentação populista de confundir discordância política e luta partidária com a celebração oficial, no Parlamento, dessa data simbólica.
Os deputados são os representantes do povo e foram eleitos democraticamente. Considero o gesto da Associação 25 de Abril, de Mário Soares e de Manuel Alegre um péssimo serviço à democracia, que eles próprios ajudaram a criar.
A agenda ideológica do governo revela-se todos os dias. Com a justificação da crise, da troika e do défice, o governo todos os dias rasga mais uma página do contrato eleitoral com quem o elegeu. Até aqueles que estavam dispostos a cooperar, em nome da paz social e do pragmatismo, como é o caso da UGT, são sobranceiramente enganados pelas medidas que desmentem os acordos e a própria noção de negociação.
Não só aumenta a possibilidade e a flexibilidade dos despedimentos, como reduzem imenso as indemnizações, para quase desaparecerem, como desaparecem os subsídios de desemprego e os fundos da segurança social. A dignidade do trabalho e dos trabalhadores deixou de ser um valor em si mesmo. Entretanto, a execução orçamental segue as pisadas que se esperavam. e a Ministra da Justiça mostra um total desrespeito pelo Tribunal Constitucional.
Os impostos não têm retorno em serviços prestados aos cidadãos. Diariamente o País deprime-se, encolhe, definha. Talvez valha a pena lembrar a Vítor Gaspar que a paciência tem limites.
Vários andares, níveis de consciência, capacidade em estar atento. Vários espelhos onde se vê e revê a memória, o passado, o corpo, onde se encontra o próprio ou a imagem que se projecta para fora do próprio.
Vários sons, aflitos, suaves, assustadores, arrepiantes, calmos, ondulantes. Poucas vozes as dos poemas, poucos os poemas nesse poema inteiro. Poucas as palavras ouvidas em tom de confidência. Vários os tons de branco e castanho velado, de dourados secos e velhos, de vermelho e ocre. Várias as texturas dos tecidos, das pedras, das madeiras, da água, da poeira.
Várias as portas e as chaves que se abrem e fecham, que escondem e mostram, que começam e acabam, por onde se entra e se sai. Vários os movimentos de dança e desespero, de poder e submissão, de amor e de ódio, de recolha, de manipulação, de despojamento. Vários os momentos de partilha e solidão, de crueldade e sedução.
Caóticos e loucos, calados e gritantes, desconexos e pueris, inacabados e em fragmentos, de risos e viagens, sonhos de mulheres que são, que fizeram, que tiveram, que deram, que quiseram, que desejaram, que fugiram, que romperam. Tantos os sapatos que podemos calçar, que nos ensinam a calçar e que nos fazem meninas e velhas, monstros e anjos. Impossíveis as palavras para este espectáculo, defini-lo ou contá-lo, explicá-lo ou senti-lo. Surpreendente, impensável, lindíssimo e provocador.
Mais uma vez parabéns ao Teatro Meridional e a todos os colaboradores, que fazem de cada trabalho uma experiência imperdível. Destaque para as extraordinárias actuações das actrizes Ana Lúcia Palminha, Carla Galvão e Susana Madeira.
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